Antes de partir

Hoje a Jade não é turquesa. Tomou conta de mim um sem cor.

Quero falar agora porque sei que minha voz vai calar após o desfecho esperado.

Quero falar sobre o dom de ser mãe.

O de minha mãe.

Uma mulher corajosa, que assentiu me receber no ventre e acompanhar minha vida me dando educação, valores, carinho, uma caminhada que ela quis que fosse vertical, acompanhada de perto, quase com uma lupa para não deixar escapar nada de sua vista precisa.

Aceitou travar batalhas com o meu espírito para me mostrar a via da bondade, da honestidade, obrigando-me a ouvi-la sempre, as mesmas palavras sábias.

Os amigos repetiam sempre e até em tom de brincadeira a mais reiterada das frases: a vida é uma sementeira. Que verdade !

Se empenhou demais para que eu me tornasse uma pessoa melhor. Afinal, seria esse o papel dos pais, não é?

Mas minha mãe se superou.

Eu, que não quis ter filhos, me tornei a mãe de uma senhorinha risonha quase centenária.

Até isso pensou? Me deu a suprema honraria de me tornar mãe. A sua mãe.

Lutando bravamente para sobreviver nos últimos meses me concedeu a extraordinária oportunidade de conviver junto a ela, unidas num quarto, mês a mês, dia a dia, hora a hora, minuto a minuto, para que eu recobrasse valores perdidos no trajeto da vida, revisse passos dados, posições assumidas, erros cometidos, tudo num olhar silencioso, sem uma única palavra,

Me devolveu a ligação com a espiritualidade, me fez meditar, me dedicar à leitura edificante, ela e o Pai do universo, numa imersão que só seria possível durante a pandemia.

Diante de meus olhos, vi seu corpo ir perdendo a vida. Agora, olho para essa mulher forte, que trabalhou e lutou toda a vida e a vejo levitando entre a Terra e o Céu.

Ela ainda respira afoita. Descansa mãe, vou ficar bem, prometo!

E obrigada mãe, você já me recolocou no caminho, antes de partir.